Terapia Familiar: Uma Visão Sistêmica

Na atualidade, um número expressivo de famílias sofre com uma má comunicação ou até mesmo a falta dela em seus núcleos familiares. E a comunicação é uma condição de convívio e de sustentação deste sistema que precisa ser integrado. Contudo, quando há algum embaraço ou obstáculos na comunicação, há prejuízos que causam instabilidade e desequilíbrio ao sistema. O presente texto visa traçar alguns fatores sobre a comunicação e suas interferências no contexto familiar, por meio da teoria sistêmica, entendendo que a comunicação é a base de todas as relações e que a família é o primeiro núcleo em que se estabelecem as redes comunicativa

A COMUNICAÇÃO E SEUS AXIOMAS FAMILIARES

Na concepção sistêmica, na qual o mundo é visto nos termos de relações e integrações, é impossível dissociá-los, considerando sua complexidade e instabilidade e a intersubjetividade do indivíduo, cujo funcionamento é entendido como um sistema ramificado de ligações particulares.

Segundo Penteado (1997 apud MARACAIPE, 2014), a palavra comunicar deriva do latim comunicare e tem como significado pôr em comum. A autora destaca que a comunicação deriva da familiaridade, da intimidade, do contato direto e frequente, do agrupamento caracterizado por forte ligação. E tal agrupamento é calcado na uniformidade de pensamento dos indivíduos que têm como objetivo o entendimento entre eles.

Para compreender o significado da palavra comunicação, Maracaipe (2014) relata que qualquer ação ou não ação é uma forma de comunicação, porque toda conduta interacional tem valor de mensagem. Numa situação interacional, mesmo quando o indivíduo não tem interesse de se comunicar, é impossível não comunicar. Ou seja, na atividade ou na inatividade, na palavra ou no silêncio, tudo tem sua valia de mensagem. Um indivíduo, mesmo sozinho, tem a possibilidade de dialogar em fantasia, com suas alucinações. É uma maneira de comunicação interna e que obedece algumas regras da comunicação interpessoal.

Watzlawick, Beavin e Jackson (2013) propõem cinco axiomas, sendo o primeiro a afirmação da impossibilidade de não comunicar. O segundo e terceiro axiomas propõem que qualquer comunicação implica um compromisso e define um tipo de relação. A comunicação não somente transmite informação, mas, ao mesmo tempo, impõe um comportamento. O quarto axioma trata sobre a comunicação digital e analógica. Segundo Crema (1985 apud MARACAIPE, 2014), neste axioma a natureza de uma relação está nas contingências da pontuação das sequências comunicacionais entre os comunicantes. Além disso, a comunicação digital é a aplicação da palavra, e que as palavras são sinais arbitrários que se manipulam de acordo com o arranjo lógico da linguagem. Crema (1985 apud MARACAIPE, 2014) ainda define a comunicação analógica como toda comunicação não verbal, que abrange postura, gestos, expressão facial, inflexão de voz, ritmo, sequência.

Os seres humanos comunicam digital e analogicamente. A linguagem digital é uma sintaxe lógica sumamente complexa e poderosa, mas carente de adequada semântica no campo das relações, ao passo que a linguagem analógica possui a semântica, mas não tem uma sintaxe adequada para a definição não ambígua da natureza das relações (WATZLAWICK, BEAVIN; JACKSON 2013, p. 61).

O quinto axioma é descrito como todas as comutas comunicacionais, que ou são simétricas ou complementares, e que são calcadas na igualdade ou na diferença. Watzlawick, Beavin e Jackson (2013) chamam a atenção sobre a influência recíproca simétrica como cunho de igualdade, em que os comparsas tendem a refletir sobre o comportamento um do outro. Na complementaridade, existe uma maximização das diferenças. Nesse caso, o comportamento do parceiro complementa o outro. Todos esses axiomas explicam a pragmática da comunicação relacional, a partir dessa concepção, e entendendo que qualquer comunicação implica um compromisso, e define o ponto de vista do emissor de suas relações com o receptor. Portanto, torna-se importante analisar as relações comunicativas.

E tomando como referência os axiomas, uma série de mensagens trocadas entre indivíduos pode ser denominada de interação. É a partir das interações que se desenvolvem as transferências de conhecimentos e o confronto de ideias. Tem-se também a situação de diálogo, em que existe a participação de duas ou mais pessoas que dialogam ou trocam informações, partindo deste pressuposto de que os indivíduos estão inseridos num sistema e que suas interações e integrações estão interligadas. E a comunicação é o elo que constitui a condição de convívio e de sustentação de todo o sistema, que é baseado na igualdade ou na diferença.  Como nesse sistema não há uma isonomia de comunicação, ele sofre alterações e tais alterações tornam o sistema dinâmico. Contudo, têm-se sistemas que não são rígidos, mas, sim, sistemas arqueáveis. E ainda há as relações familiares que pertencem a outro plano, em que as regras comuns de convívio não são aplicáveis. Essa relação funciona como um emaranhado de tensões, brigas e reconciliações, em que a lógica é autocontraditória, cujos valores e ética são distorcidos e vivem num universo de constantes crises e reconciliações, porém não conseguem retirar lições com os erros cometidos no passado, e são inseridos num ciclo em que a história começa de novo e sempre no marco zero.

Diante do sistema flexível, e partindo do pressuposto de que os sistemas são, em sua totalidade, interligados, a unidade familiar é entendida como um entrelaçado de interações sociais e concessoras de apoio indispensável à manutenção das integridades física e psíquica de seus integrantes. Sendo assim, a família torna-se referência de valores, crenças e comportamentos. Consequentemente, a unidade familiar consiste no suporte e tem seu início no ciclo vital da vida, no qual são estabelecidas as primeiras relações. E, com o passar do tempo, o suporte vai ampliando e atingindo outros membros familiares. Ou seja, a socialização e a transmissão das experiências individuais e grupais vão sendo transmitidas e acumuladas de geração a geração, porém com certa diversificação. Dessa forma, a unidade familiar sofre modificações ao longo dos anos e tais modificações são influenciadas por fatores históricos e sociais que também são transmitidos de geração a geração. Com isso, a família dita seu molde e sua dinâmica, e traduz seus fatos e atos aos seus integrantes, e até os fatos ocultos são transmitidos, uma vez que cada família tem seu dinamismo.

Ainda conforme as afirmações de Alvim (2012), no sistema familiar, não há um estatuto fixo, pois o ciclo vital da família sofre mudanças, mesmo ocorrendo as transferências dos padrões de interações e integrações. Poderá ter mudanças e, às vezes, pode saltar algumas gerações, mas a identidade familiar será preservada de modo a assegurar a continuidade. Ou seja, não necessariamente há uma sequência de gerações com os mesmos moldes de interações, mas em uma determinada geração os padrões se repetem.

Segundo Cerveny (1994) descreve que:

Toda família repete e há repetições que mantêm a família como um sistema, podendo inclusive, prover esse sistema uma identidade especificada que o diferencia dos outros. A repetição dos padrões interacionais multigeracionalmente toma outra dimensão quando impede o sistema familiar de mudar e crescer ou quando mantém uma família num nível tão disfuncional que a interação terapêutica se faz necessária. (CERVENY, 1994, p. 41)

 

Segundo Sarti (2003 apud ALVIM, 2012), toda família permite um intercâmbio com outros sistemas familiares, por ter membros familiares. Porém, cada membro terá sua forma de se movimentar dentro do sistema e também sua própria versão da história familiar. E cada família estabelecerá uma relação dialética e recíproca nas influências e impactos sob sua história. Cada indivíduo traça seus significados para as experiências vividas dentro de suas limitações, criando, assim, sua visão de mundo e sua cultura. Cada indivíduo é fator e produto de sua história, mas está intrinsecamente inserido num sistema interativo.

CONCLUSÃO

Enfim, é a partir do entendimento e da relevância deste tema, que as interações e integrações nas relações com o outro que o relacionamento familiar pode ser mais bem analisado. Ou seja, por meio da comunicação que há entre os seus integrantes, pode-se questionar como o terapeuta ou profissional que trabalha as relações poderá aplicar, ou desenvolver técnicas que minimizem os problemas comunicacionais. Por fim, a comunicação faz parte da ação do ser humano e é considerada fator importante para a análise das relações do sistema familiar. Sendo assim, seu estudo se faz necessário para melhor conhecimento das famílias e orientação das intervenções que precisam ser realizadas para adquirir uma comunicação mais saudável.

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